Sou chamada a atravessar o véu de Avalon. Desde muito jovem, fiquei imersa em leituras acerca das Mitologias das Ilhas Britânicas, do Ciclo Arturiano da Matéria da Bretanha, dos Celtas, no contexto da Religião, e das tradições esotéricas ocidentais. Estudante e apreciadora da Arte Celta La Tène Insular, do movimento Arts & Crafts e da Pintura Pré-Rafaelita, desenvolvi a minha mente visual e a vocação para a Alta Imaginação. Sonhos vívidos e nostalgias profundas remeteram-me à Ilha de Avalon.

O noroeste feérico da minha densa raíz luso-galega e os horizontes britânicos são o meu lar espiritual e as minhas origens. Em criança, descobri a Irlanda dos meus antepassados gaélicos, graças a uma viagem familiar a Dublin e à cidade monástica de Glendalough, nas montanhas de Wicklow. Depois, li The Celtic Twilight, que foi o meu primeiro contacto com as fairy-legends, folk-tales e tradições recolhidas por W. B. Yeats e Lady Gregory.
Banfháidh inata, sempre pressenti acontecimentos e preferi a vida interior. Tinha por missão ir a Glastonbury, Somerset, e à Cornualha. Em meados dos anos noventa, aos quatorze anos, firmei a profunda intenção de lá chegar. Fiz a inscrição para a minha primeira peregrinação na Grã-Bretanha, em Maio de 1999, aos dezanove.

A Sacred Journeys for Women foi criada por uma artista britânica, na Califórnia. Participei várias vezes, até 2005. Fui sempre a mais jovem nos grupos e a única portuguesa naqueles contextos, durante muitos anos. Mais do que a universidade, onde cumprira o meu percurso académico, eu reconheci que o Vale of Avalon é a minha Alma Mater.
As diversas peregrinações em Inglaterra, na Cornualha, na Irlanda e na Escócia, tiveram ampla cobertura de localidades e sacred sites, entradas em todas as edições da Glastonbury Goddess Conference, visitas privadas e sem restrições a Chalice Well & Gardens, Stonehenge e The Roman Baths, com farewell dinner na Pump Room.

Tivemos as inestimáveis colaborações de autores da Celtic and British Mystery Tradition, pioneiras do Movimento da Deusa, académicos de Pré-História, impulsionadoras da Arqueomitologia, e artistas. Contámos com uma participação de Geoffrey Ashe MBE FRSL, historiador cultural britânico, que foi uma sumidade em assuntos arturianos e autor de King Arthur’s Avalon: The Story of Glastonbury.
Nunca recebi sacramentos religiosos. Confio na Altíssima Providência Divina. Louvo a Danann, Bríghid, Morrígan, Cailleach, e mais divindades, mas também a Maria de Nazaré, Maria de Magdala, Brígida de Kildare. Agradeço as bençãos da Água Primordial, que aflora da Terra, percorre todos os seres e se eleva aos céus, em neblinas etéreas.

No início do milénio, enquanto em solitária quietude junto a Chalice Well, tive a certeza de que esse era o regresso à essência da minha alma e àquele local. Resgatei o meu vínculo com Avalon. Jovem como eu era, soube qual é a minha vocação e que a minha vida seria dedicada aos Mistérios.
Sou grata a quem me mostrou os caminhos insulares que eu não teria encontrado tão cedo, se tivesse ido sozinha, mais tarde na vida. Sem prejuízo, devido a essas primeiras experiências na Grã-Bretanha, eu senti imensa necessidade de aprofundamento e de vivências singulares nos locais que funcionam como centros ativadores.

Em 2003, sem que nada me forçasse, decidi partir sozinha para o extremo sudoeste da Cornualha, onde procurei viver, durante algum tempo. Eu sabia que era essencial estar só, longe de tudo e todos que me eram familiares. Dei um salto para o desconhecido e fui levada pela mão, para testemunhar um poder que para mim foi e continua a ser evidente e manifesto.
Na magnética península de West Penwith, antiquíssima Belerion, existe uma grande densidade de sacred sites. O local sempre foi farol para o tráfego marítimo, favorável às trocas comerciais e fórum da sabedoria ancestral. É a parte visível de uma região há muito submersa, que se prolongava para além das Ilhas Scilly e que ficou conhecida no universo lendário como o Reino de Lyonesse.

Depois de experiências desafiantes e enriquecedoras, reconheci um chamamento inequívoco que me levou a regressar a Glastonbury e às peregrinações. Ao longo da primeira década do milénio, continuei a viajar pelo sudoeste de Inglaterra e na Cornualha, com estadias em Sussex e Devon e temporadas na Península de Land’s End. Continuo a receber muitos insights do passado longínquo e dos territórios submersos, apesar de me ter dedicado integralmente aos Avalon Mysteries.
Créditos: Andreia em Stonehenge e com o grupo em Chalice Well & Gardens, por Stephanie Hamberger.
Imagem de destaque:
Vesica Piscis cover, design de Frederick Bligh Bond, Chalice Well. Postal por Walter Scott, Bradford, c. 1959. CC BY-NC-ND 4.0 DEED
